TJ-BA registra 128 novos processos de racismo; falta de representatividade e “impunidade” evidenciam a discriminação racial na Bahia

Publicado em 21/03/2025 às 03:09:24
TJ-BA registra 128 novos processos de racismo; falta de representatividade e “impunidade” evidenciam a discriminação racial na Bahia

Em 2025, o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) registrou 128 novos processos relacionados a racismo, conforme dados do Painel de Estatística do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) atualizados até 31 de janeiro. A informação evidencia a importância do debate sobre prevenção e combate ao racismo no estado, especialmente no Dia Internacional de Combate à Discriminação Racial.

A discriminação racial, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), se manifesta por meio de distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem étnica, com o objetivo de anular ou restringir o reconhecimento e o exercício de direitos e liberdades fundamentais em igualdade de condições.

No Brasil, o racismo é crime desde 1989, com a Lei 7.716. Inicialmente, racismo e injúria racial eram distintos, sendo o primeiro direcionado à integralidade de uma raça e o segundo, à ofensa individual baseada em cor, raça ou etnia.

A Lei 14.532/2023 equiparou a injúria racial ao crime de racismo, tornando os crimes raciais imprescritíveis e inafiançáveis, com pena de reclusão de dois a cinco anos, além de multa.

A defensora pública Mônica Magalhães, coordenadora do Núcleo de Equidade Racial, explica que a Defensoria Pública passou a atuar na defesa das vítimas de crimes raciais a partir de 2023, oferecendo acolhimento, orientação jurídica e representação processual.

Além dos novos casos, o TJ-BA possui 4.496 processos pendentes relacionados ao tema. O advogado Marinho Soares, doutorando em Direito Público pela UFBA e membro do coletivo Entidades Negras, relata que muitas vítimas não denunciam ou desistem dos processos por sentirem incompreensão e impunidade.

Soares atribui essa situação ao racismo institucional, presente na falta de compreensão e reconhecimento do racismo por parte de delegados, promotores e juízes, em sua maioria brancos.

Mônica Magalhães concorda, apontando a necessidade de formação de profissionais especializados e com consciência racial para lidar com o tema. Ela destaca que a burocracia judicial frustra a percepção de justiça, mesmo sendo o racismo um crime inafiançável e imprescritível.

A defensora explica que nem todos os processos de racismo chegam à esfera penal, sendo muitos resolvidos na esfera cível por meio de acordos, como o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP). No entanto, ela questiona se esses acordos satisfazem as vítimas e promovem a reflexão sobre as práticas raciais.

Soares relata um caso em que uma auxiliar de enfermagem foi insultada por um médico com termos racistas e, ao denunciá-lo, foi processada por injúria, difamação e calúnia. O Ministério Público sugeriu um ANPP para o caso da auxiliar, o que Soares considera inadequado.

Ambos os especialistas defendem que a representatividade no judiciário é fundamental para uma justiça mais preparada para lidar com casos de racismo. Soares cita um caso em que um gerente de banco ordenou a expulsão de um homem negro, algemado, dizendo que não fazia acordo com "esse tipo de gente". Ele acredita que o caso, tratado como uma simples "fala ríspida" pelo tribunal, teria sido facilmente resolvido com uma leitura racial mais atenta, se houvesse mais pessoas negras no julgamento.