Julgamento do caso Mariana acaba em Londres com vítimas pedindo justiça

Para Mônica dos Santos, ex-moradora de Bento Rodrigues, o rompimento da barragem do Fundão em Mariana, Minas Gerais, em 5 de novembro de 2015, demarcou um divisor de águas em sua vida. "Perdi tudo: casa, roupas, projetos e sonhos", lamenta.
Após a tragédia, Mônica se formou em direito, buscando entender os meandros do caso e representar outros afetados nas negociações com as empresas responsáveis. Recentemente, acompanhou em Londres as etapas finais de uma ação civil movida na Justiça inglesa.
O desastre, causado pelo rompimento de uma barragem de rejeitos da Samarco, empresa controlada pelas gigantes BHP (anglo-australiana) e Vale (brasileira), resultou em 19 mortes e devastou cerca de 700 km de território, desde Minas Gerais até o Oceano Atlântico.
A ação em curso na Inglaterra busca responsabilizar a BHP, com base no direito ambiental brasileiro. A corte britânica ouviu testemunhas e especialistas em diversas áreas, uma vez que a BHP era listada no país à época do rompimento.
O processo movido no Reino Unido reúne cerca de 641 mil vítimas, incluindo 21 mil membros de comunidades tradicionais quilombolas e indígenas, e abrange 31 municípios. As indenizações pleiteadas somam aproximadamente 36 bilhões de libras (R$ 270 bilhões).
Paralelamente, 15 municípios optaram por deixar a ação inglesa, após aceitarem um acordo de repactuação no Brasil, no valor de R$ 170 bilhões, envolvendo empresas, governo federal, governos de Minas Gerais e Espírito Santo, e comunidades atingidas.
Do montante pago por Samarco, Vale e BHP Billiton, R$ 6,1 bilhões foram destinados aos municípios ao longo de 20 anos, valor considerado inferior ao buscado na ação inglesa. Apesar disso, 26 dos 49 municípios elegíveis aderiram ao acordo brasileiro, e mais de 70 mil pessoas se cadastraram em um programa indenizatório que prevê R$ 35 mil para cada.
O prefeito de Mariana, Juliano Duarte, rejeitou o acordo brasileiro, alegando falta de participação na negociação e valores insuficientes para suprir as necessidades do município, que enfrenta queda de receita desde a paralisação da mineração.
Tom Goodhead, CEO do escritório que representa os atingidos, avalia o julgamento de forma positiva para as vítimas, ressaltando o alto nível de envolvimento da BHP e da Vale nas operações da Samarco. Ele critica ainda o uso do dinheiro como "arma" pelas empresas, que se aproveitariam do desespero das vítimas para oferecer acordos desvantajosos.
Fernanda Lavarello, diretora da BHP Brasil, afirma que o foco da empresa é o acordo brasileiro, destacando o compromisso com a reparação no país, que inclui indenizações, reconstrução de moradias e reparação ambiental. A diretora alega que a BHP não foi informada de riscos nem participou de ações que causaram o rompimento.
Na esfera criminal, a Justiça Federal absolveu Samarco, BHP Billiton e Vale, além de diretores, gerentes e técnicos, por falta de provas. Mônica recorreu da decisão.
Para Mônica, a impunidade prevalece. "O que eu consigo perceber nesses quase dez anos é que, para essas empresas, matar compensa", desabafa. A esperança reside na responsabilização em Londres, que poderia influenciar a decisão no Brasil e levar à punição dos responsáveis.
A sentença do caso inglês é aguardada para meados do ano. Caso a BHP seja considerada culpada, a fase seguinte, em outubro de 2026, definirá os beneficiários e os valores das indenizações.