Pix com função de cartão de crédito pode ser realidade no fim de 2025, prevê Campos Neto
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, diz que o Pix poderá ter a função de cartão de crédito a partir do fim de 2025. Em entrevista à Folha de S.Paulo, ele antecipa que o novo instrumento financeiro já está em desenvolvimento pela área de tecnologia da instituição e será um avanço do uso do meio de pagamento no Brasil.
"Não precisaria mais ter o cartão, você poderia fazer a função cartão de crédito direto com o banco", diz. Segundo ele, essa agenda evolutiva está no planejamento, mas não pode ser feita no curto prazo e dependerá da continuidade na próxima gestão. O mandado de Campos Neto termina em 31 de dezembro.
De acordo com o chefe do BC, o instrumento facilitará a garantia do crédito para as empresas a um custo mais barato. "Com essa plataforma, o banco pode fazer o desconto na sua própria taxa de risco. Vai baratear muito para o lojista em termos de quanto ele tem que dar de desconto para receber o dinheiro na frente", afirma.
O presidente do BC explicou que hoje, quando o consumidor compra parcelado e o lojista faz um adiantamento do fluxo a receber, o risco é do banco emissor do cartão. "Só que, como o lojista precisa muito daquele dinheiro, ele faz o adiantamento em uma taxa de desconto que é muito maior do que a taxa de risco do banco", diz.
Segundo ele, o Pix com a função de cartão de crédito pode impulsionar a redução do custo do adiantamento que o lojista tem das parcelas a receber.
Na reta final do seu mandato, Campos Neto avalia que o GT (Grupo de Trabalho) do spread bancário "claramente" deveria contar com representantes do BC. O spread bancário é a diferença entre os juros cobrados pelos bancos ao emprestar dinheiro e os juros pagos por eles para captar os recursos.
O GT foi criado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no mês passado, após reunião com banqueiros, no Palácio do Planalto, em um momento de ciclo de alta da taxa básica de juros (Selic) –hoje em 11,15% ao ano.
"O spread bancário tem algumas coisas que a gente já identificou há algum tempo e que teve dificuldade de combater", diz o chefe da autoridade monetária.
Um dos problemas identificados é a baixa recuperação do crédito no Brasil. Quando esse volume de crédito a ser recuperado é baixo, muitos bancos deixam de ir atrás dos clientes para reaver o dinheiro. Não apenas a recuperação é baixa, como o processo é demorado.
Entre os países que têm recuperação de crédito pior que o Brasil, segundo Campos Neto, estão Zimbábue, Turquia, Burundi, Venezuela e Haiti. "[O banco] cobra mais, porque tem mais incerteza", afirma.
Como revelou a Folha de S.Paulo, o GT do spread bancário estuda uma proposta para permitir que empresas usem o fluxo de receitas futuras com o Pix como garantia de empréstimos bancários.
Na avaliação de Campos Neto, o uso do Pix como recebível precisará de uma tecnologia que seja capaz de bloquear os fluxos de forma reversa. "A gente tem isso em mente para ser desenvolvido. Essa mesma tecnologia que faria conseguir ter os recebíveis da função de cartão de crédito dentro do Pix", diz.
Para isso acontecer, as instituições financeiras precisarão ter uma forma de entrada do Pix que garanta o bloqueio da quantia.
De acordo com o presidente do BC, será preciso fazer uma melhoria tecnológica dentro da própria plataforma do instrumento de pagamento instantâneo a fim de permitir esse bloqueio reverso. "Isso também faria com que a gente conseguisse fazer essa parte de recebíveis como garantia", afirma.
PARCELADO SEM JUROS
Para o presidente do BC, o debate sobre o impacto do parcelado sem juros nas operações feitas com cartão de crédito acabará voltando no futuro. No ano passado, o assunto entrou no radar durante as discussões sobre o rotativo do cartão de crédito e expôs divergências entre os diferentes elos da cadeia de crédito, mas um redesenho da modalidade foi descartado.
"É um tema muito difícil de resolver porque é uma cultura que já está estabelecida na forma de as pessoas consumirem, e acho que isso vai voltar a ser discutido em algum momento", afirma.
Na avaliação dele, o risco adicionado ao sistema com o parcelado se estabilizou após as mudanças adotadas no crédito rotativo. Campos Neto deixou claro, no entanto, que essa discussão não está ligada ao desenvolvimento da função de crédito no Pix.